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Mudança de comportamento após o AVC: Parte do luto ou parte da lesão?
Mudanças comportamentais após AVC
O tema da II SEMANA AÇÃO AVC, evento realizado pela ASSOCIAÇÃO AÇÃO AVC em 2022, foi AVC - UMA DOENÇA DA FAMÍLIA
A neuropsicóloga Maria Gabriela fala sobre a importância da mudança de comportamento após o AVC.
Pensando no seguinte cenário:
Você está acordando e se sente estranho, tenta se levantar da cama, mas não consegue erguer o seu tronco, não consegue mexer a perna para sair da cama, mesmo assim você tenta e acaba caindo.
Você sabe que precisa de ajuda, algo está acontecendo e você começa a gritar chamando alguém da sua família para vir lhe ajudar e sua voz está estranha o seu grito não sai e você mal consegue mexer a boca, sua fala sai enrolada, as palavras estão estranhas, quer falar uma palavra e vem outra.
Ali naquela situação, você pensa:
É o fim!!
E bem naquela hora que você desiste de tentar chamar alguém, chegam os paramédicos, lhe examina, lhe pergunta algumas coisas e lhe coloca sobre uma marca.
E ao chegar na emergência vem mais um monte de perguntas, acesso para o soro, lhe pedem para levantar a perna, dizer seu nome, repetir algo e você não consegue.
Mais um pouco você tá numa sala gelada, deitado com a cabeça dentro de um tubo, passa mais um tempo e você está em um quarto de hospital, está tudo nublado e confuso, você não consegue falar nada do que quer e sai tudo errado, vem alguém e lhe diz que você teve um AVC, seus familiares e a equipe da unidade de AVC ou do hospital vão de cuidar de você.
Exames, atendimento, e visitas passam vários dias e está chegando o dia de ir para casa.
Essa tentativa de entender o impacto do AVC na vida da pessoa, o medo, e o desânimo diante das limitações.
É preciso imaginar como a pessoa acometida pelo AVC se sentiu depois do susto inicial e em contato com a realidade do hospital.
No hospital o paciente vai fazer vários exames, receber tratamentos e medicações.
Ainda no hospital o paciente pode conseguir entender que foi vítima de um AVC e possivelmente o paciente e a família tem esperança de que quando estiver em casa tudo vai se ajeitar.
No entanto, é no dia-a-dia dentro de casa que o paciente e a família se deparam com as dificuldades e os desafios causados pelas limitações que acompanham o AVC.
Após o AVC o paciente pode se sentir estranho, não conseguindo se expressar direito, não conseguir fazer o que fazia antes da doença e a família percebe que a pessoa não é mas a mesma, e vem o pensamento dos familiares:
Porque ele não faz, o que antes conseguia fazer?
Porque ele não vai fazer fisioterapia?
Por que ele disse sim para tudo e continua sentado no sofá?
É manha que ele está fazendo ?
Será que ele ficou sequelado e não entende nada?
Ou será que ficou traumatizado?
Ao falarmos de AVC precisamos pensar no cérebro é ele que possibilita que as pessoas se movimentem, sintam, vivam emoções e raciocínio.
Para realizar essas e tantas outras atividades, o cérebro trabalha em um complexo esquema de redes.
O cérebro conecta suas diferentes partes
As diferentes regiões do cérebro vão se organizando e se conectando entre si, para desempenhar determinadas funções.
Como uma grande orquestra, tudo que é produzido pelo cérebro é executado dentro de um conjunto maior.
Por exemplo:
Uma pessoa para participar de uma simples conversa ela precisa acionar não apenas as partes cerebrais responsáveis pela linguagem.
Como precisa antes ouvir o que foi dito, precisa olhar para a pessoa que está falando, precisa atenção, ter memória para guardar na mente o que a pessoa falou e é preciso organizar os pensamentos para responder.
Ainda precisa da expressão emocional, do tom da voz nas expressões faciais e se falar precisa entender, tanto o tom da voz como também as expressões faciais e o significado do que a outra pessoa está falando.
As mudanças emocionais e as alterações de comportamentos são bem comuns após o AVC, são causados por fatores neurológicos relacionados ao dano que a lesão fez ao cérebro e por fatores situacionais em resposta à situação que o paciente está vivendo, tem haver também com o contexto que a pessoa está inserida.
Esses dois fatores influenciam no desenvolvimento de sintomas e intensificam as sequelas do AVC.
É comum os pacientes ficarem deprimidos após sofrerem um AVC, os pacientes que ficam com dificuldade de se planejar, se organizar, que não conseguem regular suas emoções e que sofreram lesão na parte anterior do cérebro geralmente desenvolvem depressão.
A depressão pode ter haver com a lesão em si, com a parte do cérebro que foi danificada ou a depressão pode vir em resposta a toda aquela situação difícil que a pessoa está vivenciando.
A mudança de comportamento é parte do luto ou da lesão?
Analisando podemos dizer que vem dos dois pontos, porque a mudança de comportamento pode ocorrer devido a lesão cerebral que vai modificar a maneira dela se comportar e dela ser, em resposta reativa as dificuldades, limitações e os problemas cognitivos que ela vai enfrentar e há essa perda da vida anterior que ela vai ter.
Um estudo feito na Austrália mostrou que 1/3 das pessoas que tiveram AVC vão sofrer de depressão, podendo ocorrer logo em seguida da doença ou anos depois do AVC.
O paciente pode também sentir medo, ansiedade e apresentar sintomas de transtorno de estresse pós-traumático.
As cenas ruins voltam na sua mente, junto com a sensação de que alguma coisa ruim vai acontecer e em algumas ocasiões pode reagir com medo e pânico exacerbado.
O paciente pode ficar com problemas emocionais sério só pelo fato dele ter sofrido o AVC, que não avisou direito que vinha, mudou a vida e o jeito de ser, que prejudicou a família, onde a mesma passa por situações monetárias difíceis.
Muitos déficits cognitivos após o AVC são relacionados especificamente ao local da lesão, problemas de atenção e concentração, lentidão na velocidade com que a pessoa processa informações, problemas no funcionamento sensitivo.
Ou seja, o paciente aparece como uma falta de iniciativa e começa a fazer várias coisas e não consegue terminar nada ou não consegue manter nada na mente, tudo isso é comum depois da lesão cerebral, sem ter haver com a localização da lesão propriamente dita no cérebro.
Somente isto é suficiente para ficar triste
Imagina para o paciente que precisa voltar a caminhar e não consegue.
As pessoas pensando que você está com medo e meio sensível demais, ou fazendo manha.
Mas pode ser que problema seja, que o paciente perdeu a noção do espaço e que não sabe consiga colocar o pé no chão, e como ter segurança assim?
Existe a possibilidade do paciente e a sua família pensarem que o paciente está recuperado e na volta ao trabalho o paciente não consegue fazer nada do que fazia antes do AVC ou não entende nada do que antes ele entendia, o paciente não sabe por onde começar.
A parte final de todo esse cenário é que o paciente precisa se cuidar muito, pois tem o risco de sofrer outro AVC.
O AVC prévio de fator de risco para outro AVC
Neste caso o paciente vai pensar, não tem mais jeito e está tudo acabado.
Mas não está tudo acabado!
Existe vida depois do AVC
Problemas de atenção e para ter iniciativa, executar e finalizar ações, lentidão podem melhorar treino.
Dificuldade de regular as emoções, as reações emocionais exacerbadas ou catastróficas o paciente pode aprender a regular.
Se tudo melhorar totalmente o paciente pode aprender estratégias para compensar as dificuldades, principalmente se for muitas coisas.
Você e sua família vão precisar entender muitas coisas, se adaptar e até mesmo repensar alguns valores.
É possível vencer os desafios causados pelo AVC.
O paciente, a família e a equipe de profissionais de saúde precisam trabalhar em conjunto.
Há pessoas que após o AVC aprenderam a ter uma postura mais saudável e positiva da vida e que tiveram chance de dar valor ao que realmente é importante para elas.
*Esta palestra faz parte da programação da II SEMANA AÇÃO AVC (evento destinado a pacientes e familiares de AVC, promovido pela Associação AÇÃO AVC).