Pacientes e familiares » Cuidadores e Familiares de AVC »

Manter a motivação e valorizar as pequenas conquistas

Como valorizar as conquistas na reabilitação após o AVC?

23/02/2023

O tema da II SEMANA AÇÃO AVC,  evento realizado pela ASSOCIAÇÃO AÇÃO AVC em 2022, foi  AVC - UMA DOENÇA DA FAMÍLIA

A fisioterapeuta neurofuncional Luciana Protásio fala sobre a importância de manter a motivação e valorizar as pequenas conquistas


O  AVC é um problema de saúde pública, podendo causar óbitos, mas também muitas incapacidades no indivíduo. O AVC não escolhe sexo, idade, raças ou etnias. Existem vários casos de mulheres, homens, crianças, idosos e jovens que sofreram AVC.

E como manter a motivação e valorizar as pequenas conquistas que vão acontecendo ao longo de todo o processo pós alta hospitalar?

Importante ter em mente que cada paciente tem que ser bem avaliado e bem acompanhado pela equipe multidisciplinar e que cada caso tem uma reabilitação e tempo diferente.

A reabilitação pode funcionar de formas diferentes para cada caso, pois existem: Tempo, emocional,  condições sociais, econômicas, financeiras, institucionais e educacionais diferentes que podem interferir na evolução.

Cada  paciente vive esse processo de maneira diferenciada e particular.

Alguns pacientes têm uma rede de apoio maior, outros têm uma rede de apoio menor. Ou variando na fase de reabilitação em que a pessoa esteja.

O AVC muda a vida, não somente da pessoa acometida mas também do seu núcleo familiar. A rotina de todos ao redor é alterada, seja do familiar cuidador, do ambiente familiar, do ambiente de trabalho e dos amigos da pessoa que sofreu o AVC.

Todos vão passar a viver de alguma forma sobre aquele novo grau de funcionalidade, de autonomia e de autogestão que a pessoa após o AVC vai passar a viver.

O AVC é muito súbito, a pessoa que é acometida pela doença vê sua rotina e seu cotidiano mudarem de repente .

Pois ao passar mal e ser socorrida, seja em um pronto socorro ou a uma unidade de AVC, o paciente se depara com um diagnóstico, tempo de hospitalização e com incapacidades ocorridas do AVC. A vida é completamente mudada. 

E quando o paciente recebe alta e volta para casa, vem o questionamento dos familiares e do próprio paciente: A partir de agora, como vai ser ?

Dúvidas após a alta hospitalar após o AVC
Dúvidas após a alta hospitalar após o AVC

Por isso a reabilitação do paciente é muito importante e que toda a família seja acompanhada por uma equipe multidisciplinar que ajudará neste processo.

Além do fisioterapeuta neurofuncional, a equipe multidisciplinar deste paciente, vai contar com  o fonoaudiólogo, psicólogo, a assistente social e o terapeuta ocupacional e, às vezes, precisando de outros profissionais que possam ser mais pontuais e não tão rotineiros.


Diante deste processo que pode levar muito tempo, como perseverar diante disso?

Geralmente os pacientes que sofreram AVC, ficam com algum tipo de sequelas.

Alguns ficam sem andar, sem conseguir mover um braço ou a mão, sem conseguir falar de maneira adequada ou compreensível. Existem casos em que o paciente fica com déficit cognitivo, desorientação e dificuldade de entendimento.

Contudo isto, como a família e o paciente consegue perseverar, persistir e se manter motivado em busca da recuperação e reabilitação completa?

Como a família ou o cuidador irão permanecer sendo uma rede de apoio nessa jornada?

Tudo isso vai exigir uma perseverança e dedicação muito grande.

Irão ocorrer mudanças na rotina e no ambiente da família, pois serão necessárias adaptações no domicílio e muitas vezes adaptações financeiras e no ambiente de trabalho. 

Quando pensamos em tempo de reabilitação, que pode durar meses ou mesmo anos, vai dependendo da fase em que o paciente se encontra e até mesmo o paciente vai se adequando a um determinado tipo de terapia. Cada tipo vai depender da abordagem que aquele profissional trabalha, seja o profissional fisioterapeuta, fonoaudiólogo ou terapeuta ocupacional.

Muitos pacientes consideram esse trabalho muito lento, ele tem a idéia em geral que o processo de reabilitação está sendo muito devagar e o que foi dito para ele inicialmente, não necessariamente corresponde com o que está ocorrendo de fato.

Porque existem sim essas variações, pois vai existir ao longo do caminho muitos fatores influenciando.

Não só os fatores físicos, como a perda de força, e uma alteração de tônus.

Aquele braço que no início estava mole, vai apresentando rigidez da musculatura envolvida. O corpo, de uma forma geral, vai se ajustando e se adaptando e a tendência é que o paciente recupere sua autonomia e independência.

O paciente fica sempre procurando ter alguém do seu lado, porque ele não consegue fazer sozinho, mas muitas vezes o medo é que não deixa fazer determinadas tarefas sozinho.

E durante todo esse processo de reabilitação o paciente com AVC,  familiares e cuidadores precisam entender e ter perto os profissionais de confiança e que esses profissionais sejam especializados naquela reabilitação.

Um dos fatores muito válido e importante já mostrado em pesquisas científicas é uma pesquisa de Kimberly desde 2017 que fala sobre os cinco P’s da reabilitação.

Reabilitação após o AVC - Os 5 Ps
Reabilitação após o AVC - Os 5 Ps

As 5 letras P’s significa:

  1. Predição - No caso do AVC podemos pensar no prognóstico daquele indivíduo.

  2. Prevenção - Aquele indivíduo que sofreu AVC vai precisar prevenir algumas complicações que podem aparecer e que se não forem cuidados o quanto antes podem acarretar em outro AVC.

  3. Plasticidade -  Plasticidade cerebral ou neural  que é a capacidade que o nosso cérebro tem de se moldar e readaptar a essa nova situação, procurando novas conexões cerebrais que aquela área que foi lesionada não está conseguindo exercer com estímulos adequados e esses estímulos são muitas vezes através dos exercícios como na fisioterapia, na terapia ocupacional e na fonoterapia mais especializada na região facial.

    Diante disso pensar que os estímulos  devem ser especializados e adequados, não necessariamente ter muito estímulo.

    O importante  é que esses estímulos e exercícios sejam específicos para o momento em que o indivíduo esteja.

    O paciente precisa ter momentos de repouso para que o seu cérebro consolide a plasticidade e assuma esses novos estímulos para si e para manter as novas mudanças.

    É necessário repouso e um bom sono para que aconteça a consolidação do aprendizado e isso se mantenha no seu dia a dia.

    Importante ressaltar que os profissionais que estão ali envolvidos sejam especializados e direcionados a estimular essa plasticidade cerebral, de maneira positiva e benéfica, sabendo dosar e alternando esses estímulos com um momento de repouso.

    Lembrando que a hipertensão arterial sistêmica é o principal fator de risco mais presente como fator de risco para o AVC,  não é o único fator, mas é o principal e o que mais prevalece.

  4. Participação -  É  frequente em pacientes que sofreram AVC, que ao retornar para sua casa, o mesmo não queira sair, seja para um lugar que ele mais gostava, passear ou voltar ao seu trabalho mesmo com adaptações ou ele tem que ser modificado de função.

    A participação social do paciente fica reduzida e isso termina prejudicando, porque tem interferência nas suas emoções e isso pode gerar alterações no humor, depressão e estabilidade emocional.

    E isso tem que ser pensado juntamente com a rede de apoio, pois participação social é importante. Pois, vem estímulos diferentes e meios diferentes para contribuir  na recuperação. A recuperação não é somente física do ponto de vista motor, de motricidade, de movimentos, de sensibilidade e de fala  é para as atividades do dia a dia e da recuperação emocional.

    Será necessário entender esse novo mundo e a nova vida que agora se apresenta, seja aquele o paciente que nunca teve contato com questões de acessibilidade ou nunca vivenciou.

    Vai ser necessário fortalecer sua participação social, servindo como exemplo e modelo para que as pessoas previnam o AVC.

    Temos que otimizar essa participação social, porque isso é uma maneira de conseguir persistir e passar por mais tempo que vai ser necessário nesse processo sem abandonar ou sem ter motivação nos seus processos de reabilitação como um todo.

    Não temos que esperar uma reabilitação com grandes resultados para poder comemorar ou uma recuperação total que alguns infelizmente não vão ter.

    É importante ir valorizando as pequenas conquistas que vão acontecendo.

    Alguns exemplos de pequenas conquistas:

    Antes o paciente só conseguia sentar em uma cadeira com o apoio de encosto e tinha que ter alguém o apoiando.

    Agora o paciente já consegue sentar sem apoio do encosto e ajuda.

    ou

    Agora quando meu esposo vem me ajudar a levantar da cama, antes eu não fazia força nenhuma, agora eu já consigo fazer força.

    São pequenas conquistas e, a partir daí, que se constroem grandes conquistas.

    Temos que nos apegar e valorizar cada conquista recebida, as palavras que são pronunciadas e que talvez no início o paciente não conseguisse falar ou não conseguisse de maneira tão compreensível.

    Todo esse processo de reabilitação, motivação, de valorizar as pequenas conquistas passa também pelo processo de personalização

  5. Personalização - Os processos terapêuticos, as condutas e as intervenções usadas precisam ser personalizadas para cada indivíduo que sofreu AVC.

    Pode ter sido mesmo tipo de AVC isquêmico, no hemisfério direito na região frontal e ter passado a mesma quantidade de dias internados ou mesmo ter passado por neurocirurgia ou não.

    Mas cada paciente é um caso diferente, existem condições prévias diferentes, tem condições físicas e emocionais diferentes e socioeconômicas. Então precisa se ter uma personalização e essa é uma particularidade que se vai ajustando com os profissionais de saúde para com o paciente e familiares e vai ser trabalhado e personalizado em conjunto.

    Em termos de quais objetivos e as metas que serão traçados juntos. Por exemplo, fisioterapeuta, paciente, família, fonoaudiólogo, todos os profissionais que acompanham traçam juntos metas para serem buscadas e alcançadas em conjunto. Importante ter submetas, digamos assim menores e que devem ser conquistadas e valorizadas, porque através delas que o paciente vai chegar nessa meta mais alta.

    E com isso o indivíduo vai conseguindo ter maior autonomia que é o livre arbítrio e ter sua capacidade de escolhas sem estar na dependência mais do familiar/cuidador.

    Não necessariamente aconteça como imaginou ou no tempo que imaginou que seria, mas isso tem que ser trabalhado.

    Não tenham medo ou vergonha de procurar ajuda personalizada para alguns pontos específicos que vocês sintam ao longo do processo, seja esse processo que ocorra a 1, 2 ou até mesmo 10 anos após o AVC. Cada fase vai ser diferente e é necessário abordagem entre diversos Profissionais de Saúde com você e até mesmo trocando experiência com outros pacientes ou familiares.
Luciana Protásio - fisioterapeuta
Luciana Protásio - fisioterapeuta

*Este vídeo faz parte da programação da II SEMANA AÇÃO AVC (evento destinado a pacientes e familiares de AVC, promovido pela Associação AÇÃO AVC).